O carregamento dos eléctricos fora de casa tem que mudar
O modo como carregamos um carro eléctrico fora de casa é altamente complexo, sem necessidade disso, quando comparado com a simplicidade que é colocar combustível.
Em qualquer país europeu os preços são apresentados de forma clara, em pórticos, com valor por unidade. Para pagar basta usar um cartão de débito ou crédito.
Este problema estava resolvido, então porque é que se seguiu um caminho estranho de várias apps ou cartões RFID que não funcionam em todos os pontos de carga? Conseguem imaginar a idiotice que seria querer ir de carro de Portugal a França e não conseguir abastecer em Espanha porque as bombas da Cepsa e Repsol apenas aceitam pagamentos via uma aplicação para o telemóvel e para se conseguirem registar nela precisam de uma morada e dados fiscais espanhois?
Não cabe na cabeça de ninguém, mas é isso que acontece com os carregamentos dos eléctricos.
Se eu quiser carregar o meu carro numa viagem fora de Portugal preciso fazer o trabalho de casa e saber a que rede pertencem os carregadores e ver se as várias aplicações que tenho me permitem carregar lá. Num carro a gasolina apenas preciso de saber a sua localização e horário, se fizer a viagem de madrugada. O cartão multibanco chega para pagar em qualquer local.
Certo que isto está a mudar, e alguns pontos de carga rápida vão passar a ser obrigados a ter pagamento com cartão, mas é estranho que este não tenha sido logo o modelo inicial.
Em Portugal é melhor, e pior
Em Portugal felizmente um cartão ou aplicação serve para pagar em qualquer carregador público (com excepção da rede Continente e Tesla). Isto já ajuda, a quem é cidadão nacional, pelo menos. Porque antes da aplicação Miio, quem queria vir a Portugal tinha dificuldades em arranjar forma de carregar sem uma morada e dados fiscais nacionais.
Mas somos um dos poucos países europeus onde se cobram os carregamentos por minuto, a par com França e Áustria.
O valor de carregamento por minuto é complexo de calcular porque está dependente da velocidade de carregamento do carro, da capacidade do posto de fornecer energia e, no caso de carregadores rápidos, a curva de carregamento atira estas contas completamente por terra.
E quem quer passar de combustível para electrões acha estas contas confusas. Primeiro temos que contratar um CEME, a quem podemos pagar por kWh consumido ou minuto (caso da Prio). Depois temos o valor a pagar ao operador do posto de carregamento que é normalmente ao minuto, e nalguns casos também ao kWh. Confuso? Claro que sim, e ainda se pode pagar uma taxa de activação. No final é preciso juntar as várias taxas.
Imaginem ir a uma Galp querer colocar 20 litros de combustível com este modelo? O nosso CEME até é a Repsol que nos leva 50 cêntimos por litro, mas o OPC Galp cobra uma taxa de activação de 30 cêntimos mais 30 cêntimos por litro e 50 cêntimos por minuto. Mais as taxas no final, é preciso uma aplicação para fazer o cálculo aproximado, e digo aproximado porque não sabemos quanto tempo podemos demorar a abastecer.
Outros países têm um modelo mais simples
Noutros países não se entrou nesta loucura. O preço a pagar é por kWh, que é o que faz sentido, e nalguns casos após o carregamento terminar é então cobrado um valor ao minuto, uma taxa de ocupação do posto.
Este modelo é simples e justo. O preço por kWh são 50 cêntimos, o nosso carro vai carregar dos 10% aos 80% que são 50 kWh, vamos pagar 25€.
E é fácil comparar preços entre carregadores. Se um cobra 50 cêntimos e outro cobra 45 cêntimos, já sabemos qual o mais barato. Não é preciso andar com contas aos minutos que o carro demora a carregar.
Até as aplicações não fazem sentido
A aplicação Miio é de se tirar o chapéu. Embora complexa derivado do nosso sistema de carregamentos, dá logo uma estimativa do valor a pagar e até simula o valor para outras empresas de carregamento. Permite usar um cartão para carregar, que é sempre mais rápido que usar uma aplicação, e indica na aplicação o estado do carregamento.
O pagamento é feito por cartão de crédito ou débito directo e o valor a pagar é indicado durante e logo no final do carregamento.
Ora, com tão bom exemplo, seria de pensar que as aplicações que aparecem a seguir seriam pelo menos iguais ou melhores até. Errado!
Apps onde a informação não aparece actualizada, outras que funcionam com pré-pagamentos de valores fixos (EVIO) e a pior de todas, a Via Verde que apenas indica o tempo decorrido e no fim do carregamento ficamos sem saber quanto se pagou, é preciso esperar quase 5 dias para poder consultar o valor.
O que se espera de qualquer aplicação é a indicação do preço por kWh (ou no caso português uma simulação complexa do valor a pagar) e após iniciar a carga indicar quantos kWh já foram carregados, o tempo decorrido, a potência a que se está a carregar e a percentagem da bateria que o carro indica.
E esta informação acima deve também estar presente de forma visível no ecrã de carregamento do posto.
Simplificar, não complicar
Nem tudo precisa de ser uma reinvenção de algo já mais que testado. A nossa sociedade lida com pagamentos há séculos, um valor dá direito a uma unidade de algo. E isto sempre foi assim porque é o que faz sentido.
Não é preciso muito, basta seguir o que já se faz nos postos de abastecimento. Colocar o cartão, autorizar pagamento, ligar o cabo ao carro e começar a carregar. No final basta colocar novamente o cartão para terminar o carregamento e retirar o cabo.
O posto pode apresentar um código QR no ecrã com um link, sem necessitar de nenhuma aplicação, para seguir o estado do carregamento. É o que acontece nos carregadores da Kempower.
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